Patrícia Sousa Borges, Advogada Associada do Consórcio Archer & Associados, apresenta uma análise ao o Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março.

COVID-19: E A CONCRETIZAÇÃO DE UM REGIME JURÍDICO ESPECIAL

Foi publicado em Diário da República, o Decreto Lei nº 2-B/2020 que procede à execução da declaração do estado de emergência efetuada pelo Decreto do Presidente da República n.º 14-A/2020, de 18 de março, e renovada pelo Decreto do Presidente da República n.º 17-A/2020, de 2 de abril.

Pese embora, o artigo 5º do referido decreto, continue a concretizar o Dever geral de recolhimento domiciliário, a verdade é que a publicação deste decreto, concretizou uma medida ainda mais restritiva.

Pela primeira vez em Portugal, após o 25 de abril, é declarado o confinamento obrigatório, em estabelecimento de saúde, no respetivo domicílio ou noutro local definido pelas autoridades de saúde: os doentes com COVID-19 e os infetados com SARS-Cov2 e ainda para os cidadãos relativamente a quem a autoridade de saúde ou outros profissionais de saúde tenham determinado a vigilância ativa, sendo que a violação desta imposição legal, constitui a prática de um crime de obediência, previsto no artigo 348º do Código Penal, cuja moldura da pena abstratamente aplicável pode chegar até aos dois anos de prisão.

Uma outra novidade plasmada no decreto, é a prevista no seu artigo 6º, que impõem uma limitação à circulação no período da Páscoa, proibindo os cidadãos de circular para fora do concelho de residência habitual no período compreendido entre as 00:00h do dia 9 de abril e as 24:00h do dia 13 de abril, salvo por motivos de saúde ou por outros motivos de urgência imperiosa. Esta restrição não se aplica, aos profissionais de saúde e outros trabalhadores de instituições de saúde e de apoio social, bem como agentes de proteção civil, forças e serviços de segurança, militares e pessoal civil das Forças Armadas e inspetores da Autoridade de Segurança Alimentar e Económica e ainda aos titulares de cargos políticos, magistrados e líderes dos parceiros sociais, que para o exercício das suas funções, seja naturalmente permitida a sua circulação.

Com o mesmo propósito não serão permitidos os voos comerciais de passageiros de e para os aeroportos nacionais, sem prejuízo de aterragens de emergência, voos humanitários ou para efeitos de repatriamento.

Em matéria laboral, o decreto volta a dar preferência ao exercício da atividade profissional à distância, impondo no artigo 8º, a obrigatoriedade da adoção do regime de teletrabalho, independentemente do vínculo laboral, sempre que as funções em causa o permitam.

No que respeita às medidas excecionais e temporárias de proteção dos postos de trabalho, no âmbito da pandemia COVID-19, estas estão previstas no Decreto-Lei nº 10-G/2020, de 26 de março, definindo e regulamentando os termos e as condições de atribuição dos apoios destinados aos trabalhadores e às empresas afetados pela pandemia.

As pessoas que podem beneficiar deste apoio extraordinário estão elencadas no artigo 2º do presente decreto e respeitam a empregadoras do setor social, e trabalhadores ao seu serviço, afetados pela pandemia da COVID-19 e que se encontrem, em consequência, em situação de crise empresarial, mediante requerimento eletrónico apresentado pela entidade empregadora junto dos serviços da Segurança Social.

O artigo 3º do Decreto Lei nº10-G/2020, de março define a situação de crise empresarial, como:

  1. O encerramento total ou parcial da empresa ou estabelecimento, decorrente do dever de encerramento de instalações e estabelecimentos, previsto no Decreto nº 2-A/2020, de 20 de março, ou por determinação legislativa ou administrativa, nos termos previstos no Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 demarço, na sua redação atual, ou ao abrigo da Lei de Bases da Proteção Civil, aprovada pela Lei nº 27/2006, de 3 de julho, na sua redação atual, assim como da Lei de Bases da Saúde, aprovada pela Lei nº 95/2019, de 4 de setembro, relativamente ao estabelecimento ou empresa efetivamente encerrados e abrangendo os trabalhadores a estes diretamente afetos; ou

  2. Mediante declaração do empregador conjuntamente com certidão do contabilista certificado da empresa que o ateste:
 
  1. A paragem total ou parcial da atividade da empresa ou estabelecimento que resulte da interrupção das cadeias de abastecimento globais, ou da suspensão ou cancelamento de encomendas, que possam ser documentalmente comprovadas;

  2. A quebra abrupta e acentuada de, pelo menos, 40 % da faturação no período de trinta dias anterior ao do pedido junto dos serviços competentes da segurança social, com referência à média mensal dos dois meses anteriores a esse período, ou face ao período homólogo do ano anterior ou, ainda, para quem tenha iniciado a atividade há menos de 12 meses, à média desse período.
 
Assim, caso o empregador se encontre em situação de crise empresarial, adquire os seguintes direitos:

  1. Apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho, com ou sem formação, em caso de redução temporária do período normal de trabalho ou da suspensão do contrato de trabalho, nos termos dos artigos 298.º e seguintes do Código do Trabalho;

  2. Plano extraordinário de formação;

  3. Incentivo financeiro extraordinário para apoio à normalização da atividade da empresa;

  4. Isenção temporária do pagamento de contribuições para a Segurança Social.
 
Porém, nem tudo são direitos. O empregador que beneficiar das seguintes medidas excecionais e temporárias, fica proibido, nos termos do artigo 13º do Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março, de fazer cessar contratos de trabalho de trabalhador abrangido por aquelas medidas, ao abrigo das modalidades de despedimento coletivo ou despedimento por extinção do posto de trabalho, previstos nos artigos 359º e 367º do Código do Trabalho, durante o período de aplicação das medidas de apoio previstas no presente decreto-lei, bem como nos 60 dias seguintes.

A questão, porém, não se coloca quanto às outras modalidades de cessação do contrato de trabalho, previstas no artigo 340º do Código do Trabalho, designadamente mediante por Caducidade do contrato de trabalho; Revogação do contato de trabalho; Despedimento por facto imputável ao trabalhador; Despedimento por inadaptação do trabalhador, Resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador e ainda a Denúncia do contrato de trabalho operada pelo trabalhador, que continuam a estar na disponibilidade das partes para cessação do vínculo laboral.

Porém, caso o empregador não cumpra os pressupostos para beneficiar deste regime de Lay Off simplificado, continua a ter como alternativa a Redução da atividade e suspensão de contrato de trabalho, previsto nos artigos 394º e ss do Código do Trabalho.